Volume de dados gerados e exposição da vida íntima do usuário alimentam mercado da espionagem
Brasil. Projeto de lei a ser aprovado no país estabelece restrições no uso de informações coletadas
Desde a semana passada, o Brasil entrou no mais recente frisson
mundial, o jogo “Pokémon Go”. Junto com Pikachu e Charmander, porém,
vieram também as preocupações de que os dados dos usuários estejam sendo
utilizados para propósitos de espionagem.
Antes mesmo de o jogo ser lançado aqui, um brasileiro postou no
Facebook uma teoria de que o game seria, na verdade, uma ferramenta da
agência de inteligência norte-americana CIA para saber de tudo que
acontece na vida de seus milhões de usuários pelo mundo.
Segundo essa teoria, o jogo teria sido criado pelo mesmo homem que
também é o responsável pela tecnologia do Google Earth, que, por sua
vez, seria uma ferramenta da CIA para ter acesso a dados privilegiados
de todas as pessoas com smartphones.
De fato, a Niantic – empresa “dona” do “Pokémon Go” – foi criada por
John Hanke, o mesmo empreendedor que criou a Keyhole. Com esta, no
início dos anos 2000, ele desenvolveu a tecnologia que seria
transformada no Google Earth em 2004, quando a Keyhole foi comprada pelo
Google. Esse projeto recebeu financiamento da In-Q-Tel, braço da CIA
que investe em projetos tecnológicos.
“Não conseguimos analisar se esses boatos têm um fundo de verdade, mas
sabemos que uma das formas que os governos de todo o mundo têm para
acessar informações dos cidadãos em curso de investigações é por meio de
empresas que coletam esses dados. Duvido que o jogo tenha sido criado
para isso, mas ele coleta dados que podem ser utilizados para fins de
investigações se o sistema jurídico do país em questão permitir”,
explica Luiz Fernando Moncau, pesquisador do Centro de Internet e
Sociedade da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos.
De fato, nos termos e condições do “Pokémon Go”, há um alerta de que a
empresa colabora com agências de governo e empresas privadas e que pode
revelar os dados dos usuários com essas entidades. Na prática, isso
significa que a empresa cederá esses dados caso seja demandada pela
Justiça – e talvez que ela também venda esses dados para empresas
interessadas em direcionar melhor suas publicidades.
Mas isso não é privilégio do jogo. Apesar de muitas pessoas não lerem
os termos e condições dos aplicativos que baixam, esse alerta está em
vários deles. “Não se justifica uma paranoia em cima desse aplicativo
específico (o “Pokémon Go”), mas se justifica uma preocupação em relação
ao volume de dados que geramos nos vários aplicativos que usamos e com a
forma como esses dados podem revelar informações”, conclui Moncau.
Proteção.
Antes
de ser afastada, a presidente Dilma Rousseff, em uma de suas últimas
ações, propôs um projeto de lei para regulamentar a coleta e o uso
dessas informações vindas de aplicativos de celular.
“Uma das coisas que estabelece o PL
5276/2016, por exemplo, é que a empresa não pode coletar dados a mais do
que os necessários para a prestação de determinado serviço. Outra é que
ela não pode tratar dados para finalidades diferentes daquelas para as
quais coletou”, explica o pesquisador.
Aprovada essa lei, as empresas
não poderão, por exemplo, vender fotos de usuários para empresas de
marketing se esta não for a finalidade do aplicativo.
Por enquanto, o jeito mais eficiente de se
prevenir, ainda, é não baixar os aplicativos que têm uma política de
coleta de dados muito agressiva. No site do projeto Who Has Your Back
(www.eff.org/who-has-your-back-2016), dá para descobrir quais empresas
têm as políticas de privacidade mais amigáveis e tentar dar preferência
aos serviços que não irão expor o usuário na rede.
Entenda o caso
No “Pokémon Go”, os jogadores vivem à caça das criaturas para coletá-las e treiná-las
Fotos e geolocalização.
Os usuários precisam se deslocar até os monstrinhos, mirar a câmera ao redor e encontrá-los sobrepostos à realidade na tela do celular. Para capturá-los, basta tirar uma foto com o smartphone. Para facilitar o início do jogo, o “Pokémon Go” espalha alguns integrantes da turma do Pikachu ao redor do jogador. Se a pessoa estiver em casa, ela vai fazer imagens do quarto ou da sala
Acesso.
Para que a brincadeira funcione, o “Pokémon Go” pede permissão para ter acesso à câmera do celular, à localização do jogador, ao microfone e aos dispositivos USB conectados ao smartphone.
Snap e Instagram também têm acesso a dados dos usuários
Apesar do rumor afirmar que o “Pokémon Go” estaria espionando seus usuários dentro de suas casas, outros aplicativos possuem esse mesmo acesso, como o Snapchat e Instagram, por exemplo.Assim como o “Pokémon Go”, os dois aplicativos têm acesso à câmera, ao microfone e à localização do usuário. No caso do Instagram, as fotos ficam dispostas num mapa que indica o local em que foram feitas. Segundo o site E-Farsas (conhecido por desmistificar as histórias que circulam na internet), “as empresas envolvidas no desenvolvimento do jogo ‘Pokémon Go’ não têm ligações com o Serviço de Inteligência norte-americano (CIA)”. O Google e a Niantic foram procurados pela reportagem, mas não retornaram.
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